sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Resenha: A desobediência civil (David Henry Thoreau, 1849)

Companhia das Letras (2012), 152 páginas
"À diferença daqueles que se dizem antigovernistas, eu não peço a imediata abolição do governo, mas [peço um governo] que seja melhor agora mesmo. Que cada homem faça saber qual é o tipo de governo capaz de conquistar seu respeito, e isso já será um passo na direção de alcançá-lo" (grifo do autor).

Segundo o site Impostômetro, até o dia 15 de setembro de 2014, neste ano foram pagos mais de 1 trilhão, 150 bilhões e 871 milhões de reais em impostos. Mais de 3 milhões por minuto. Quase 6 mil reais por habitante. E ainda faltam três meses para acabar o ano! Em geral, o brasileiro passa 5 meses do ano trabalhando para pagar seus impostos mas, na relação dos 30 países com maior carga tributária do mundo, o Brasil fica em último lugar em retorno de benefícios para a população. Segundo o Fórum Econômico Mundial, de 148 países comparados, o Brasil está muito mal posicionado no "ranking" de infraestrutura, educação, saúde, pesquisa e inovação, segurança pública, etc. Outro dado relevante é do levantamento entre os países do G20 (os 19 países de maior economia, mais a União Europeia): os ricos pagam menos impostos no Brasil que nos demais países. Aqui, a maior incidência de tributação indireta penaliza os mais pobres e subsidia serviços privados justamente para a parcela da população de maior renda (o "bolsa rico"). (Veja mais na seção "Leituras recomendadas", no fim deste artigo.)

Revoltado? Henry David Thoreau (1817 - 1862) demonstrou sua revolta recusando-se a pagar os impostos pessoais durante seis anos. Foi chamado a prestar contas mas manteve a resolução de não conivir com o governo: os impostos financiavam uma guerra (contra o México, que terminou com cerca de 30 mil mortes) e a escravidão, o que, para ele, era um fim amoral dado aos recursos públicos. Dessa forma foi preso, saindo no dia seguinte porque "infelizmente" (segundo suas própria palavras) alguém se propôs a quitar sua dívida. Esse episódio o inspirou a fazer um pronunciamento que, no ano seguinte, seria publicado como "Resistance to Civil Government" ("Resistência ao governo civil"), hoje mais conhecido como "A desobediência civil".

A seguir, mais que uma resenha, um sumário circunstanciado da obra, com fartas citações, incluindo passagens de outros dois textos ("A escravidão em Massachusetts" e "A vida sem princípios"), que também compõem esta edição:

  • A desobediência civil (1849)
  • Onde vivi, e pra quê (1854), 2º. capítulo de "Walden" 
  • A escravidão em Massachusetts (discurso proferido em 4/7/1854) 
  • Caminhar (1862) 
  • Vida sem princípios (1863) 

I - "O estranho é que seja necessário afirmar verdades tão simples" 


Henry David Thoreau
(1817 - 1862)
Embora breve (35 páginas nesta edição), o ensaio de Thoreau abrange amplos aspectos da questão da cidadania, suscitada pelo estopim dos impostos, constituindo um verdadeiro índice de temáticas (dispersas no texto) para reflexão dos concidadãos, começando pelo sentido de governo, a relação do indivíduo com ele (impostos, serviço militar, eleições), e dos indivíduos entre si, e avançando na abordagem do funcionalismo (incluindo os governadores) e do legalismo (a Justiça constrangida pela subserviência cega às leis). Longe de ser uma redação enfadonha, técnica, Thoreau, a exemplo de outros escritos seus, também aqui põe "no discurso uma grande dose de [si] mesmo".

O governo, para começar, admite Thoreau, é uma necessidade. Todavia, um governo é lícito apenas na medida em que cumpre seu papel como "o modo que o povo escolheu para executar sua vontade", "um expediente mediante o qual os homens, de bom grado, deixariam uns aos outros em paz". "Os governos nos mostram [...] com que êxito os homens podem ser subjugados, inclusive por si mesmos, em proveito próprio", quer dizer, é um esforço conjunto em que as pessoas se empenham, com certos sacrifícios pessoais a serem compensados pelo resultado coletivo do empreendimento. No entanto, o que a prática mostra é que esse construto social, o governo em si, "está igualmente sujeito ao abuso e à perversão antes que o povo possa agir por meio dele" e, assim, "não tem a vitalidade e a força de um único homem vivo, pois um único homem pode dobrá-lo à sua vontade". Sob o império dos que detêm o poder, o governo se torna "senão uma tradição [...] empenhada em se transmitir intacta à posteridade, mas a cada instante perdendo um pouco de sua integridade".

Candidato disponível - a única qualificação
para presidente (1848)
Exemplos desse desvio de finalidade, ou melhor, desvio da vontade popular para a vontade dos governantes, são as guerras e a escravidão. "[Soldados vão à guerra] contra sua vontade, pior ainda, contra sua sensatez e sua consciência", são meros "paióis ambulantes", e "a massa de homens serve ao Estado não na qualidade de homens, mas como máquinas, com seus corpos". Complementando com uma citação de outro ensaio, "A escravidão em Massachusetts", Thoreau reforça sua visão de que "o melhor que se pode dizer a [respeito do soldado] é que se trata de um idiota tornado notável pela farda colorida", porque, ressuscitando a etimologia grega da palavra, "idiṓtēs" é o alienado do Estado, e o soldado, agindo pela consciência de outrem, deixa de ser cidadão para ser instrumento da sofreguidão das elites governantes. 

O problema da escravidão está intimamente relacionado com o do legalismo e ilustra um extremo de obtusidade mental a que o estrito apego à Lei pode conduzir. Thoreau expressa sua solidariedade aos cativos com uma citação que aplica os princípios de um verso dos "Analectos" de Confúcio: "em um governo que aprisiona qualquer um injustamente, o verdadeiro lugar para um homem justo é também a prisão [...] a única casa num estado escravo na qual um homem livre pode viver honradamente", pois, como disse o sábio chinês, citado pelo autor, "é vergonhoso ser pobre e humilde quando o Caminho [=princípios da razão] prevalece no reino [=Estado]. Igualmente, é vergonhoso ser rico e nobre quando o Caminho cai em desgraça no reino" (Analectos 8:13). Contudo, essa percepção da prevalência ou não do Caminho é fortemente distorcida no sistema político e judiciário. "Estadistas e legisladores, estando tão completamente entranhados na instituição, nunca conseguem observá-la de modo distinto e franco", "têm o hábito de esquecer que o mundo não é governado por diretrizes e conveniências", e "a verdade de um advogado não é a Verdade, mas a coerência, ou uma conveniência coerente". "Aqueles que foram formados na escola da política fracassam agora e sempre ao encarar os fatos" e, assim, o estadista é "incapaz de separar um fato de seu contexto meramente político e de contemplá-lo de modo absoluto, tal como se apresenta ao intelecto". Nesse sentido, em conexão com um polêmico julgamento da época, sobre a recaptura de escravos fugidos, Thoreau se pergunta se a Justiça e Deus esperam pelo veredito de juízes bitolados, porque há questões que nos afetam antes como homens do que como cidadãos.

Escravo açoitado, Louisiana (1863)
Sobre o governante/juiz/legislador, "um funcionário, para não dizer um homem ", "era seu papel [...] fazer com que as leis desse estado fossem executadas; desde que [...] tomasse cuidado para que, ao agir assim, não violasse as leis da humanidade". Isso, contudo, não é respeitado pois, fazendo "conexão [apenas] com as conseqüências aparentes", "ninguém se baseou na verdade. Simplesmente se uniram em bando, como de costume, apoiando-se uns nos outros, mas apoiados todos sobre o nada", isto é, decisões e julgamentos se dão no âmbito estreito das conveniências institucionais, não no da amplidão da vida. "A lei nunca tornou os homens sequer um pouquinho mais justos; e, por força de seu respeito por ela, até mesmo os mais bem-intencionados são convertidos diariamente em agentes da injustiça" e daí, fazendo uma generosa concessão aos governantes, Thoreau diz que "se julgássemos esses homens apenas pelos resultados de suas ações, e não por suas intenções", deveriam ser tratados como sabotadores do verdadeiro fim social do governo. Não é, portanto, de se estranhar que "legisladores [...] não cogitam fazer nenhuma reforma essencial [...] nem chega[m] a vislumbrar o assunto". Insistindo na manutenção das leis injustas que amparam seu status quo, o governante/juiz/legislador é como uma prostituta que "ergue a cauda do vestido, e arrasta a alma na lama". "O homem rico [...] está sempre vendido à instituição que o torna rico [...] quanto mais dinheiro, menos virtude". Para quebrar esse ciclo vicioso, admoesta o autor, "não é hora, então, de julgar de acordo com os precedentes, mas de estabelecer um precedente para o futuro".

II - "Quem pode estar sereno num país onde governantes e governados são desprovidos de princípios?"



A relação com o governo aparece na própria experiência do autor ao ser preso por não pagar os impostos. Como ele recapitula, "não pude deixar de me espantar com a insensatez daquela instituição que me tratava como mero amontoado de carne, sangue e ossos a ser trancafiado  [...] decerto concluíra por fim que aquele era o melhor uso que poderia me dar [...] Percebi que, se havia uma parede de pedra entre mim e meus concidadãos, havia um muro ainda mais difícil de transpor ou atravessar para que eles fossem tão livres quanto eu". "Eu não podia deixar de sorrir ao constatar o modo laborioso como trancavam a porta às minhas reflexões, que no entanto seguiam sem qualquer obstáculo ou dificuldade, sendo que eram elas tudo o que havia de perigoso. Como não podiam me alcançar, eles tinha resolvido punir meu corpo [...] Percebi que o Estado era tolo [...] que não sabia distinguir seus amigos de seus inimigos, e perdi todo o resto de respeito que ainda tinha por ele, passando a sentir somente pena" (grifo do autor). De fato, "o Estado nunca confronta intencionalmente a consciência , intelectual ou moral, de um homem, mas apenas seu corpo, seus sentidos". Outro detalhe que se perde atrás da abstração das instituições sociais, "o governo", "o partido", "o povo", etc., é que "afinal de contas, é com homens que eu discuto, não com papéis - e ele [o homem] escolheu por vontade própria ser um agente do governo". No fim das contas, trata-se das consciências individuais das pessoas, e é delas que deve partir o desejo, e as ações, para a realização de um governo melhor.

Sob "[a represália do estado,] torna[-se] impossível a um homem viver honestamente". No caso específico de seu país natal, Thoreau chega a afirmar que "[um homem] não pode, sem se desonrar, associar-se com [o governo dos EUA]". Se alguém se nega a ir a uma guerra, mas paga imposto, está indiretamente financiando um substituto para ser assassino em seu lugar. "Aqueles que, embora desaprovando o caráter e as medidas de um governo, empenham a ele sua obediência e seu apoio são sem dúvida seus defensores mais conscienciosos, e por conta disso [...] os mais sérios opositores das reformas". Dessa forma, é preciso assumir a oposição contra o governo ilegítimo, que governa para si, em detrimento do bom senso, das leis da humanidade. "A regra da conveniência [de um governo] não se aplica [nos casos] nos quais um povo, bem como um indivíduo, precisa fazer justiça, custe o que custar". Por exemplo, falando da escravidão, "quem quer que tenha discernido a verdade recebeu sua autoridade de uma fonte mais elevada do que a mais elevada justiça terrena, que só é capaz de discernir a lei. Ele se vê constituído em juiz do juiz". Isso, obviamente se aplica a todo o resto. Na passagem mais famosa do texto, Thoreau nos convoca à seguinte reflexão a esse respeito: "Será que um cidadão deve, ainda que por um momento e em grau mínimo, abrir mão de sua consciência em prol do legislador? Nesse caso, por que cada homem dispõe de uma consciência? Penso que devemos ser primeiro homens, e só depois súditos." Enfim, um apelo: "Se [a injustiça] for do tipo que requer que você seja o agente da injustiça contra outra pessoa, então, eu digo: Viole a lei[!]". "Que cada habitante do estado dissolva sua união com [o governo] enquanto ele postergar o cumprimento de seu dever".

Não é que Thoreau seja um anarquista, no sentido pejorativo do termo, mas, como ele afirma "tenho tanto desejo de ser um bom concidadão quanto de ser um mau súdito", quer dizer, um bom cidadão de um governo justo mas um mal subalterno de um injusto. Tampouco propõe que nos tornemos paranoicos com ideias de revoluções, obstinação com cada detalhe do sistema, mas, a exemplo dele, que disse "me preocupo em rastrear os efeitos de minha sujeição", "que cada um trate de fazer apenas o que lhe cabe, e no tempo certo". "Não vim ao mundo predominantemente para fazer dele um bom lugar, mas para viver nele, seja bom ou ruim. Um homem não tem a obrigação de fazer tudo, mas alguma coisa; e o fato de não poder fazer tudo não o obriga a fazer alguma coisa errada", "é seu dever, pelo menos, manter as mãos limpas e, mesmo sem pensar no assunto, recusar o apoio prático ao que é errado". Como, porém "não se pode realizar uma reforma íntegra e honrada mediante o uso do 'menor esforço' [...] não há como deslizar morro acima", o desobediente civil tem de estar preparado para certos efeitos de ordem social, que seguem sua própria transformação interior: "A ação baseada em princípios, a percepção e a prática do que é certo, isso muda as coisas e as relações; é algo necessariamente revolucionário [...] não divide apenas estados e igrejas, ela divide famílias; mais que isso, divide o indivíduo, separando o que há de diabólico nele do que há de divino". Se parece pouco "alguma coisa", o autor consola com otimismo, dizendo que "não importa quão pequeno possa parecer um ponto de partida: o que está bem feito é para sempre".

Sobre a pouca adesão a um enfrentamento do governo ilegítimo, Thoreau expressa um certo desalento. Alguns comentários em "A desobediência civil" e em "Vida sem princípios" parecem terem sido escritos com vista aos dias de hoje. Por exemplo, ele diz que "as reformas têm um grande número de jornais a seu serviço, mas nem sequer um único homem". A apatia das pessoas é bem descrita a seguir: "Quanto vale um homem honesto e patriota nos dias de hoje? Eles hesitam, lamentam e às vezes reivindicam; mas não fazem nada a sério e para valer. Esperarão, com boa vontade, que outros curem o mal, para que eles não mais tenham que lastimá-lo". E se é o medo de agir sozinho? E a tal sociedade civil organizada? Bem, infelizmente "vi até que ponto poderia confiar, como concidadãos e amigos, nas pessoas entre as quais eu vivia [e] constatei que a amizade era só para os bons momentos; que eles não se dedicavam muito a praticar o bem". 

De fato, ação conjunta exige unidade de propósitos, compartilhamento de ideais, confiança recíproca, etc. Mas tudo isso estava (e está mais ainda hoje) comprometido com o hábito das pessoas de se desviarem em distrações improfícuas, enfraquecedoras da coesão social conscienciosa. Thoreau fala do hábito de "atulhar suas mentes [...] [terreno] que deveria ser consagrado ao pensamento", de "transformar o aposento mais íntimo da mente num verdadeiro salão de bar", isto é, fala da ocupação mental do cidadão que se compraz em ser alienado pelo pão e circo da mídia, da indústria do entretenimento frívolo, etc. (pondo em linguagem moderna). Aliás, na condição de idiotizado (no sentido etimológico citado acima), fala do "pobre sujeito [...] orgulhoso de sua volumosa correspondência" - atualizando, "redes sociais", não? - "[mas que] não tem notícias de si [mesmo] há muito tempo", portanto, alienado de sua própria função no mundo, porque, se o Homem é um animal político (organizado socialmente, que é a ideia da palavra grega usada por Aristóteles), então, assim como "uma planta [morre se] não pode viver de acordo com sua natureza [...] o mesmo com um homem": acaba se anulando como Homem, e passa a existir como marionete... um corpo atuado sob volição de outro. Assim, agir como as massas, "ser popular", "significa decair verticalmente".

III - "Qual é o valor de qualquer liberdade política se não for um meio para a liberdade moral?"


Então, "por que [o governo] não valoriza suas minorias sensatas?". Já vimos que Thoreau o via como um dispositivo que engendra sua própria perpetuação. Como o governo não são os papéis, mas as pessoas (afinal, é com pessoas que discutimos), são pessoas que desprezam o bom-senso com o intuito óbvio de se enraizarem no poder. Lá, perdem de vista que "o progresso [na sucessão de regimes de governo] é um progresso na direção a um verdadeiro respeito pelo indivíduo", que "o resultado de um bom governo é tornar a vida mais valiosa - o de um mau governo é torná-la menos valiosa". Que governo não é uma instituição estática, mas tem de evoluir - e sua evolução deve ser tal que capacite os cidadão as prescindirem dele! Este é o verdadeiro princípio da anarquia (do grego "an-", "sem", "arkhía", "governo"). Aliás, podemos concordar com Thoreau, que disse que "não são muitos os momentos da vida nos quais vivo sob um governo", isto é, quanto maior o grau de conscientização dos cidadão, menos necessidade há de um mecanismo que os faça "deixarem em paz uns aos outros". Cerca de 500 anos a.C., Platão já dizia o mesmo sobre os hábitos das pessoas: "Haverá para uma cidade maior prova do vício e da baixeza de sua educação do que a necessidade de médicos e juízes?" ("A República"). Thoreau se pergunta sobre essa estagnação do progresso do governo: "Será a democracia, tal como a conhecemos, o último aperfeiçoamento possível em matéria de governo? Não é possível dar um passo adiante em direção ao reconhecimento e à organização dos direitos do homem?". E, já que o objetivo é a evolução da consciência: "Há 1800 anos [...] foi escrito o Novo Testamento; no entanto, onde está o legislador com suficiente sabedoria e talento prático para se valer da luz que essas escrituras lançam sobre a ciência da legislação?". Enquanto isso: "A política e a rotina diária [são] funções vitais da sociedade humana, mas deveriam ser desempenhadas de modo inconscientes, como as funções análogas do corpo físico. São infra-humanas, uma espécie de atividade vegetativa. [Ter consciência delas é como] se tornar consciente dos processos de digestão num estado doentio". Mas "'o melhor governo é o que absolutamente não governa', e quando os homens estiverem preparados para tanto, esse será o tipo de regência que terão".

A propósito, numa democracia doente, o máximo de importância que o cidadão tem é o de votar nos seus "representantes". Thoreau diz que "para fazer o bem prevalecer [...] basta que [as pessoas] tenham Deus ao seu lado, sem precisar esperar pelo voto que lhe dê a maioria". "Além do mais, qualquer homem mais direito que seus vizinhos constitui em si uma maioria de um". Ser cidadão apenas nas urnas é ser pusilânime, mas, para as reformas necessárias ao progresso, a cidadania tem de ser ativa e exige sacrifícios: "Assim é toda mudança para melhor, como o parto e a morte, que convulsionam o corpo". "Deposito meu voto, talvez, de acordo com o que julgo correto; mas não estou vitalmente preocupado com a vitória do certo. Estou disposto a deixar isso para a maioria [...] Um homem sábio não deixará o que é correto à mercê da sorte". O votante, "adota um dos candidatos [...] como o único disponível, provando [...] que ele próprio está disponível para todos os propósitos do demagogo".

Para o verdadeiro cidadão:

"Expresse seu voto por inteiro, não por meio de uma simples folha de papel, mas por toda a sua influência""

"O destino do país não depende de como votamos nas eleições - nesse jogo o pior dos homens se equipara ao melhor -, não depende do tipo de papel que colocamos na urna uma vez por ano, mas do tipo de homem que cada um de nós coloca na rua ao sair de casa a cada manhã."

O cartoon original, do site "Folha de Dourados", tinha uma texto explicativo.
Mas tem como ser mais claro que a própria imagem?

Apêndice: A desobediência civil na prática


Um dos exemplos mais notáveis de desobediência civil foi dado por Mohandas Karamchand Gandhi, o Mahatma ("grande alma"), tanto no início de sua carreira na África do Sul (1893 - 1914), como na sua longa luta pela independência da Índia (1915 - 1947). Aferrado a seus princípios morais, Gandhi não tinha outras armas para a batalha a não ser a coragem e o "apego à verdade" (satyagraha). Em 1907, Gandhi escreveu no jornal "Indian Opinion" que "tanto o exemplo quanto os escritos [de Thoreau] são exatamente aplicáveis no presente aos indianos no Transvaal". Sobre o autor de "A Desobediência Civil", ele disse que "foi um grande escritor, filósofo, poeta [...] que não ensina nada que não esteja ele mesmo preparado para praticar", que foi "um dos maiores e mais morais homens que a América já produziu [...] ele foi para a prisão por causa de seus princípios [e , além do mais,] está escrito para todos os tempos" e que "sua lógica incisiva é incontestável" ("For passive resisters", 1907).

A passagem abaixo, um discurso do Mahatma, extraído do filme "Gandhi", sumariza a essência de seu plano de ação - a provocação da consciência do inimigo, reconhecendo nele as potencialidades de sua humanidade latente:

"Admiro essa coragem. Também preciso de coragem, pois, por essa causa, eu também morreria. Porém, meus amigos, não há causa nenhuma pela qual eu me disporia a matar. [...] Vão nos prender, nos multar e confiscar nossos bens mas não tomarão nossa dignidade se não a entregarmos. [...] Estou pedindo que lutem. Que lutem contra o ódio deles. Não que o provoquem. Não desferiremos um golpe. Mas receberemos golpes. E, por meio da nossa dor, faremos que eles percebam a injustiça. Isso será doloroso como toda luta é dolorosa, mas não perderemos. Não podemos perder. Podem torturar o meu corpo, quebrar os meus ossos, e até me matar. Então, eles terão o meu cadáver mas não minha obediência."

Memorável cena do filme Gandhi (1982), de Richard Attenborough. Gandhi (em pé), interpretado por Ben Kingsley,
propõe para hindus e muçulmanos ultrajados pela "Lei Smuts", na África do Sul, o plano de "revolução pacífica" que caracterizaria também sua luta pela independência da Índia.

Leituras complementares recomendadas

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