terça-feira, 6 de maio de 2014

Resenha: "Kardec, a Biografia" (Marcel Souto Maior, 2013)

Foto: Liliane Cardoso






Porto Alegre, RS — Na foto, o escritor e jornalista Marcel Souto Maior apresenta sua mais recente obra literária, Kardec — A Biografia. O livro foi lançado durante a 59º edição da Feira Internacional do Livro de Porto Alegre, em 2013.







Fiz a leitura recente da obra "Kardec, a Biografia" de Marcel Souto Maior (Record, 2012).

Como ando curiosa sobre o estudo a respeito do Espiritismo, achei por bem começar conhecendo o seu fundador. Acredito que a história da pessoa que defende um ideal diz muito a respeito da sua obra. A partir do relato da sua vida, tenho, portanto, a percepção do seu legado.

O autor inicia nos apresentado o biografado com o seu nome de batismo Hippolyte Léon Denizard Rivail, aos 50 anos, presenciando o fenômeno das "mesas girantes". Seria o seu primeiro contato de fato com esse fenômeno. Uma prática que se tornara moda em Paris, Londres, Nova Iorque e São Petersburgo que consistia em "(...) mesas de todos os pesos e tamanhos se erguiam do chão e se moviam em todas as direções, sem que ninguém as levantasse. Algumas chegavam a atingir o forro do teto e a se espatifar lá embaixo, como se estivessem dominadas por forças ocultas. Outras flutuavam no ar e pousavam diante das testemunhas, como folhas ao vento. Muitas seguiam as ordens e contraordens dos comensais. Direita, esquerda, sobe, desce, para."


E assim, com formação educacional da escola de Pestalozzi (conheça mais a respeito no artigo Um Remédio para a Humanidade), desde os 19 anos estudioso da hipnose, do sonambulismo e do poder curativo dos fluidos magnéticos, Denizard Rivail era um homem da ciência, e esse conhecimento é que será de grande valor para o que se sucederá depois desses primeiros contatos com as mesas girantes.

Logo quanto toma conhecimento de tais fenômenos, sua conclusão é que não passavam de fraudes, como de fato foi comprovado diversas vezes. Mas, ao presenciar um, em local reservado, cuja anfitriã, Sra. De Plainemaison era pessoa idônea, não auferindo qualquer ganho com isso, além de outros fatores que são descritos na obra; não havia dúvida para ele que se tratava de algo real, e que precisava ser investigado.

O homem das letras, autor de mais de vinte livros didáticos adotados por escolas e universidades da França, possuía "(...) a voz clara e firme, gestos sempre sóbrios e contidos, demonstrava um talento especial para a oratória e - como professor habituado à peleja de envolver os alunos - era capaz de iniciar sua fala no tom mais suave possível, até encerrá-la com explosões de eloquência. Fazia questão de comunicar: nas conversas, palestras e páginas dos livros. Era quase um obsessão sua ser o mais didático. E não faltavam lições a preparar e difundir naquele século de tantas dúvidas e descobertas."

Tais características, aliadas ao espírito científico, que busca a explicação racional a respeito, não poderia dar maior credibilidade a quem seria conhecido como o codificador do Espiritismo: um homem maduro, voltado para a ciência, cético, compromissado e defensor ferrenho mas coerente daquilo em que acreditava. E defendia com argumentos, sempre.

O que me chama a atenção na obra é perceber nesse homem as virtudes necessárias para que o Espiritismo tivesse a dimensão que alcançou. Um homem que nunca teve, por si, a experiência da mediunidade; que toda a sua vida depois desse primeiro contato (vem a falecer aos 65 anos incompletos, após um trabalho árduo de sedimentação da doutrina) foi dedicada a entender e explicar esses fenômenos, principalmente quando os espíritos reveladores passam a se manifestar claramente no tocante às suas intenções, dizendo-lhe a missão que lhe cabia nessa vida.

A obra atende a quem está curioso para saber a respeito do homem que seria conhecido como Allan Kardec: como se deu os primeiros contatos com o mundo espiritual, a resistência e a dedicação após perceber que se tratavam de fenômenos inquestionáveis. A própria reação da sociedade: aliados e inimigos. A relação com as outras religiões. As represálias, mas também as homenagens. Enfim, o livro vale pela leitura no sentido de conhecer o homem por detrás da doutrina espírita, e, não podendo ser diferente, ter contato com noções básicas a respeito da mesma, embora este não seja o seu foco.

Leitura corrente e agradável. Traz trechos de notícias de jornais e de outros documentos que nos permitem uma sensação de contato com os fatos no momento de sua ocorrência. E a sensação é essa: é a de estarmos ao lado de Rivail, no primeiro momento, e depois já como Kardec, acompanhando-o, assim como os espíritos que o guiaram nessa missão fizeram. Temos a oportunidade de entender um pouco do Espiritismo por intermédio da vida de Allan Kardec, o homem que a codificou.

Particularmente, fiquei impressionada com a vida de Denizard Rivail. Defender uma doutrina e divulgá-la ao mundo, quando em nenhum momento sentira qualquer fenômeno, apenas presenciara. Sofrer represálias e críticas ácidas a respeito, e ainda sim perseverar. Suas conclusões são baseadas na pesquisa e na busca incessante da explicação lógica e científica. Não falamos de um jovem imaturo, mas de um homem respeitado na sociedade e na Academia. Alguém que não mudou de opinião, e sim, defendeu e divulgou o que ele não tinha qualquer dúvida que se tratava de fatos verídicos.

Não sei se seguirei ou não o Espiritismo, mas assim como admiro Chico Xavier, aprendi a sentir o mesmo  por Allan Kardec (como ficou conhecido após a publicação da obra inaugural da doutrina espírita, "O Livros dos Espíritos"). Um vida pautada pela disciplina, responsabilidade e compromisso: virtudes que eu almejo em minha própria vivência. Essa leitura, sem dúvida, motivou-me a querer conhecer mais a respeito.

E você, prezado leitor, já leu? O que achou?

4 comentários:

  1. Também li esse livro e já fazia tempo que esperava por uma biografia de Kardec. Já havia uma biografia dele por Henri Sausse que compõe o livro "O que é o Espiritismo?", publicado pela FEB, mas muito breve, e uma outra, muito longa, numa série de três livros, de Wantuil de Freitas, mas difícil de achar, talvez só mesmo cascavilhando os sebos da vida. Outra fonte é o esboço da história do Espiritismo redigido por Kardec mas só publicado após sua morte no livro "Obras Póstumas". De modo geral, Souto Maior só faz reforçar o que já podemos depreender de Kardec através de seus próprios escritos.

    Em 2002 cheguei a baixar "O Livro dos Espíritos", obra inaugural do Espiritismo, mas não cheguei a ler. Admito que, apesar da curiosidade, o preconceito falou mais alto. Apenas em 2011 comecei a leitura, e não parei mais. Li na seqüência as 5 obras básicas (O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho segundo o Espiritismo, Céu e Inferno, A Gênese) mais as duas já mencionadas. Interessante é o sentimento de respeito, que nasce na leitura, pelo autor: de fato, Kardec foi chamado de "o bom-senso encarnado" e é assim que o percebemos.

    Seu trabalho frenético, que o levou à morte, foi reconhecido até mesmo na "New Catholic Encyclopedy", embora a igreja de Roma ignore que se conhece a árvore pelos frutos e encerre seu artigo sem lisonjas. Todavia, não foi Kardec quem me converteu ao Espiritismo, mas a doutrina e, principalmente, o sentimento constantemente alimentado nas obras de que se reconhece o cristão pelo amor ativo, reforçando os ideais do Cristianismo primitivo, longe de dogmas, de artigos de fé, de hierarquia eclesiástica... Deus é amor, logo, seus servos vivem a caridade. Simples assim. E aí Kardec se destaca uma vez mais por sua humildade, de "mero colaborador", em suas próprias palavras, que não aceita ser chamado de fundador, e renega as glórias que se votam aos líderes de igrejas. Pé no chão, chegou a afirmar que "o Espiritismo jamais dirá a última palavra", ressaltando que devemos manter a mente aberta a novas descobertas, embargando o caminho para o fundamentalismo fanático.

    A leitura é agradável, fluida. Não se contenta em abordar apenas os fatos da vida de Kardec, mas os contextualiza na História. Nem tampouco omite as dificuldades, os problemas enfrentados, às vezes até negativamente quanto ao biografado, sem fins apologéticos, que reforça a imparcialidade do autor e erige uma imagem bem humana do codificador do Espiritismo.

    Esperamos que, a exemplo do que foi feito com o outro livro de Souto Maior, "As vidas de Chico Xavier", também esse dê origem a um filme sobre o incansável lionês, para inspirar também os que ainda não puderam ler Kardec ao trabalho abnegado nos ideais do Cristianismo redivivo.

    E deixo a dica aqui: não parem aí, leiam Kardec e entrem em contato direto com sua cativante personalidade.

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    1. Amigo, obrigada pelas informações! O que faltou no meu modesto texto, tu arremataste com essas informações valiosas, que ratificam o que eu já estava pensando. Obrigada por aparecer aqui e contribuir, de forma a incentivar o interesse de quem esteja reticente em conhecer a doutrina espírita. Abraços!

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  2. Pretendo ler este livro no futuro, por isso, gostei da sua resenha. Aguçou minha curiosidade e interesse em conhcer este enfoque religioso. Concordo contigo que a leitura iniciial da biografia de Alan Kardec é um bom começo para adentrar nesta doutrina que ainda sofre com preconceitos, na sociedade em que vivemos.

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    1. Obrigada pelos comentários. E fico feliz que tenhas gostado das minhas impressões a ponto de incentivá-lo a ler o livro. Sei que a estrada da aprendizagem é longa, e fico contente de poder compartilhá-la contigo. Um livro de cada vez: vamos aprendendo e trocando informações. Beijos e abraços!

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